Na década de 1960, os psicodélicos tornaram-se associados à subcultura ‘hippie’, cujos valores anti-guerra e sexualmente liberais foram encapsulados pelo slogan lúdico “Faça amor, não guerra”.
Nesse mesmo período, cientistas e pesquisadores realizavam uma investigação científica com substâncias psicodélicas, para fins terapêuticos, como uma opção de intervenção na saúde mental. Esse estudo foi interrompido pela The Commission on Narcotic Drugs (CND), a partir da United Nations Controlled Substances Act, de 1971.
Dentre as substâncias psicodélicas estudadas, destacou-se a terapia com psilocibina para ansiedade e sintomas depressivos, que atua sinergicamente no paciente, levando-o a experiências terapêuticas, como catarse emocional, dissolução do ego e insights psicológicos.
A DS afeta consideravelmente a qualidade de vida, a autoestima e qualidade do relacionamento, uma vez que a satisfação sexual é parte importante do bem-estar psicológico, ligada à felicidade e subjetivamente relacionada ao sentido da vida e à satisfação no relacionamento. Em pessoas que se declaram sexualmente satisfeitas são relatadas taxas mais baixas de depressão, além de contribuir para a saúde física, a partir do funcionamento mais forte do sistema imunitário, pressão arterial mais baixa e menor risco de cancro da próstata.
Evidências científicas indicam que o uso de substâncias psicodélicas pode trazer efeitos benéficos na expressão e aceitação de sentimentos e comportamentos sexuais, impactam nas experiências e atitudes em relação ao sexo, estimulando sentimentos duradouros de empatia emocional, atitudes positivas em relação ao próprio corpo e estilo de vida, bem como maior curiosidade e abertura para novos experiências.
Esse estudo demonstra o impacto do uso de substâncias psicodélicas no funcionamento e satisfação sexual, em um estudo com psilocibina, comparado ao uso de ISRS escitalopram em pacientes com TDM, durante 6 semanas. O termo “funcionamento sexual” é amplamente utilizado na literatura sobre sexualidade e foi definido de acordo com os domínios do prazer vivenciado, satisfação sexual, excitação, comunicação de desejos sexuais, importância do sexo e imagem corporal.
Os participantes que usaram psicodélicos para fins recreativos e de bem-estar mostraram melhorias significativas na comunicação com os parceiros, aumento da frequência de prazer durante o sexo, aumento da satisfação com os parceiros e com a própria aparência física, após a experiência psicodélica. Relataram estar mais abertos a experimentar coisas novas em sua vida sexual e mais propensos a perceber o sexo como uma experiência espiritual ou sagrada.
Os indivíduos com depressão tratados com terapia com psilocibina, em um ambiente de ensaio controlado, mostraram melhorias desde o início até o pós-tratamento e relataram melhoria na comunicação com seus parceiros, maior prazer durante o sexo, mais satisfação com seus parceiros e com a sua própria aparência e mais propensão a perceber o sexo como uma experiência espiritual.
Por outro lado, os pacientes que realizaram um tratamento de 6 semanas com o ISRS escitalopram e a mesma quantidade de terapia relataram apenas aumento da satisfação com sua aparência e nenhuma mudança positiva em qualquer outro domínio.
Tanto o escitalopram como a psilocibina foram igualmente eficazes na redução dos sintomas depressivos e as alterações na excitação e no interesse sexual foram correlacionadas a essa redução.
Em face dos pacientes tratados com psilocibina, estes foram mais propensos a relatar aumento no interesse sexual, atividade, excitação e satisfação ao final de 6 semanas, que os pacientes tratados com escitalopram, que em média, relataram piora nos mesmos aspectos.
A psilocibina exerce os seus efeitos agudos atuando no sistema serotoninérgico, através de agonismo direto nos receptores 2A da serotonina. Dentre os pacientes que usaram psilocibina, observou-se que a ansiedade e a DS diminuíram e que o uso de psicodélicos pode promover uma capacidade de articular experiências momentâneas e abertura para novas experiências, sem julgamento ou reatividade. Além disso, os psicodélicos parecem promover sentimentos duradouros de conexão consigo mesmo e com os outros, maior disposição para aceitar ou abandonar as próprias emoções e diminuição do pensamento negativo.
Os pacientes tratados com escitalopram relataram aumento da ansiedade e níveis mais elevados de disfunção sexual após o tratamento. Tais resultados apoiam a visão de que os ISRS têm um efeito prejudicial na função sexual, para além do seu impacto na depressão e podem contribuir para a persistência ou agravamento dos sintomas depressivos, criando um ciclo vicioso difícil de quebrar.
Observou-se que os sintomas tendem a se resolver logo após a descontinuação da medicação e somente uma minoria de pacientes pode apresentar disfunção duradoura, referida como Post SSRI Sexual Dysfunction (PSSD) e caracterizada por sintomas persistentes, como anestesia genital, disfunção erétil e orgasmo sem prazer.
As causas subjacentes do PSSD permanecem em grande parte desconhecidas, no entanto, é reconhecido como um efeito secundário raro associado ao uso de ISRS.
Essas observações reforçam os sintomas explícitos de depressão relacionados ao SD, bem como a motivação, anedonia, sendo que os níveis de energia apresentaram-se mais responsivos à psilocibina, em comparação com o escitalopram. Os resultados constituem uma evidência empírica de que os psicodélicos podem exercer efeitos benéficos no funcionamento sexual e no bem-estar sexual após o uso agudo.
Apesar da elevada prevalência e do impacto significativo da DS, esta condição costuma ser subavaliada e desconsiderada em ambientes de cuidados de saúde mental. Esse descuido pode ser devido a uma variedade de fatores, incluindo o desconforto ao discutir questões sexuais ou a suposição de que a DS é uma consequência inevitável da depressão ou do seu tratamento.
Os resultados obtidos em ambos os estudos podem ser explicados pela capacidade dos psicodélicos clássicos e da terapia assistida com psilocibina promoverem melhorias a longo prazo nas funções de atenção plena e na conexão com outras pessoas significativas, impactando, consequentemente, na satisfação sexual.
Os pesquisadores identificaram oito componentes principais que contribuem para uma experiência sexual ideal: estar presente, conexão, intimidade sexual e erótica profunda, comunicação extraordinária, assunção e exploração de riscos interpessoais, autenticidade, vulnerabilidade e transcendência.
Pesquisas subsequentes evidenciaram a importância de manter um estado de espírito atento e aberto, para alcançar um desempenho sexual satisfatório. Além disso, foi demonstrado que o aumento da atenção plena aos traços, tanto em mulheres como em homens, melhorou a DS, incluindo distúrbios de excitação e interesse.
Outros estudos indicaram que vivenciar uma conexão emocional e intimidade com o parceiro pode manter o desejo e a atividade sexual em relacionamentos de maior duração e que a atividade sexual entendida como compartilhada e mútua pode contribuir para melhorar a saúde mental do casal.
Referências :
Barba, T., Kettner, H., Radu, C. et al. Psychedelics and sexual functioning: a mixed-methods study. Sci Rep 14, 2181, 2024.