As pesquisas científicas sobre o uso terapêutico das substâncias psicodélicas, no tratamento da dependência, depressão, ansiedade, transtorno de stress pós-traumático (TEPT) e diversas outras condições, é crescente em todo o mundo.
Em geral, são conhecidos os potenciais danos das drogas psicodélicas, principalmente, em casos que envolvem o uso de substâncias ilícitas, muitas vezes com o uso de múltiplas substâncias, em contextos não médicos e não supervisionados.
Contudo, é relevante ressaltar que os estudos clínicos atuais sobre agentes psicodélicos não relataram sequelas adversas crônicas. As pesquisas emergentes para fins terapêuticos, envolvendo seres humanos, são conduzidas para avaliar as propriedades psicofarmacológicas básicas e a eficácia terapêutica destes medicamentos, como complementos às abordagens psicoterapêuticas existentes ou ao aconselhamento para doenças mentais.
As drogas psicodélicas incluem uma gama de substâncias com perfis farmacológicos variados, todas com fortes efeitos na experiência consciente.
Estudos sobre os psicodélicos clássicos exercem atividade primária como agonistas no receptor 5-HT 2A, dietilamida do ácido lisérgico (LSD), psilocibina, dimetiltriptamina (DMT) e mescalina. Outras substâncias classificadas como psicodélicas, estão fora do âmbito deste estudo.
Um ensaio clínico randomizado na Suíça sugeriu que a psicoterapia assistida por LSD tinha o potencial de reduzir a ansiedade associada a doenças terminais. Doze participantes com doenças potencialmente fatais foram inscritos no estudo para receber tratamento que envolvia sessões de psicoterapia sem drogas, complementadas com duas sessões assistidas por LSD com dois a três semanas de intervalo.
Os participantes foram designados aleatoriamente para o grupo de tratamento (recebendo 200 μg de LSD [ n = 8]) ou para o grupo de controle ativo (20 μg de LSD [ n = 4], com um cruzamento aberto para 200 μg de LSD após o cegamento inicial. No acompanhamento de dois meses, o Inventário de Ansiedade Traço-Estado (IDATE) mostrou reduções não significativas na ansiedade-traço, mas reduções significativas na ansiedade-estado.
O acompanhamento com nove participantes, um ano após o tratamento, mostrou um benefício terapêutico sustentado, sem eventos adversos graves, agudos ou crônicos, relacionados ao medicamento e não houve efeitos adversos que durassem mais de um dia após uma sessão assistida por LSD.
A psilocibina também se mostrou promissora como tratamento para a ansiedade em pacientes com doenças terminais. O estudo sobre a melhoria da ansiedade no final da vida centrou-se em 12 participantes com cancro em fase terminal.
Após várias sessões de terapia não assistida por medicamentos, os participantes foram submetidos a um estudo cruzado dentro dos indivíduos, no qual receberam a medicação experimental (0,2 mg/kg de psilocibina) e o placebo ativo (250 mg de niacina) em duas sessões com algumas semanas de intervalo.
Os resultados mostraram que a psicoterapia assistida por psilocibina reduziu a ansiedade e melhorou o humor, sem efeitos adversos clinicamente significativos.
A investigação clínica sobre o tratamento da dependência do álcool com terapia assistida por psilocibina, realizada por pesquisadores do Novo México, recrutou 10 participantes com diagnóstico de dependência ativa do álcool (e sem doença mental concomitante ou outro transtorno por uso de substâncias).
Os participantes receberam apoio pré e pós-psicossocial (terapia de aprimoramento motivacional) durante 12 semanas, com uma ou duas sessões abertas nas semanas quatro (0,3 mg/kg de psilocibina, n = 10) e oito (0,4 mg/kg de psilocibina , n = 6, ou 0,3 mg/kg de psilocibina, n = 1).
Entre os participantes que completaram o estudo, a porcentagem média de dias de consumo de álcool e a porcentagem de dias de consumo excessivo foram reduzidas em mais de metade do que tinha sido relatado no início do estudo.
Efeitos adversos agudos, como náuseas e dores de cabeça leves, foram relatados por alguns participantes, mas nenhum dano clinicamente significativo ou duradouro resultou da administração de psilocibina.
A pesquisa sobre psicoterapia assistida por psilocibina para dependência incluiu um estudo de tratamento para dependência de tabaco. Esta investigação foi um projeto aberto envolvendo 15 participantes que fumavam pelo menos 10 cigarros por dia e tiveram múltiplas tentativas anteriores de cessação sem sucesso.
Os participantes receberam terapia cognitivo-comportamental antes e depois do tratamento com psilocibina. O tratamento incluiu duas ou três sessões de psicoterapia assistida por psilocibina (doses de 20 mg/70 kg ou 30 mg/70 kg), com a primeira sessão ocorrendo na data prevista para parar. Aos seis meses de acompanhamento, 12 dos 15 participantes estavam abstinentes (verificado biologicamente pelos níveis de monóxido de carbono exalado e cotinina urinária).
Os resultados da cessação do tabagismo foram significativamente correlacionados com uma medida de experiência mística nos dias das sessões, bem como com classificações retrospectivas do significado pessoal e espiritual das sessões de psilocibina.
O MDMA foi avaliado em estudo multicêntrico, randomizado, duplo-cego, confirmatório de fase 3, que observou a eficácia e segurança da terapia assistida por 3,4-metilenodioximetanfetamina (MDMA-AT) versus placebo com terapia idêntica em participantes com transtorno de estresse pós-traumático moderado a grave (TEPT).
Os participantes foram randomizados para receber MDMA-AT ( n = 53) ou placebo com terapia ( n = 51). No geral, 26,9% (28/104) dos participantes apresentavam TEPT moderado e 73,1% (76/104) dos participantes apresentavam TEPT grave. Sete participantes tiveram um evento adverso grave emergente do tratamento (TEAE) (MDMA-AT, n = 5 (9,4%); placebo com terapia, n = 2 (3,9%)). Não houve mortes ou TEAE graves.
Estes dados sugerem que o MDMA-AT reduziu os sintomas de TEPT e o comprometimento funcional em uma população diversificada com TEPT moderado a grave e foi geralmente bem tolerado.
Evidências crescentes apoiam a terapia assistida por fenetilamina 3,4-metilenodioximetanfetamina substituída (MDMA-AT) como tratamento para TEPT.
O MDMA é um entactogênio que promove a inibição e liberação da recaptação de monoaminas (principalmente por induzir a mudança conformacional dos transportadores pré-sinápticos, modula efetivamente a reconsolidação da memória do medo, aumenta a extinção do medo e promove a abertura e o comportamento pró-social.
Vários ensaios de fase 2 indicaram que o MDMA-AT tem um perfil de risco-benefício aceitável em indivíduos com TEPT. Um estudo principal de fase 3 (MAPP1) mostrou que o MDMA-AT foi bem tolerado e atingiu os objetivos primários e secundários do estudo de redução da gravidade dos sintomas de TEPT e diminuição do comprometimento funcional.
A experiência de pesquisas anteriores, tanto positivas quanto negativas, forneceu lições importantes para os atuais desenhos metodológicos, restrições éticas e protocolos clínicos e para pesquisas renovadas sobre psicodélicos envolvendo participantes humanos.
Contudo, estudos clínicos recentes demonstraram que os estudos sobre substâncias psicodélicas como agentes terapêuticos podem estar em conformidade com os rigorosos padrões científicos, éticos e de segurança esperados da investigação médica contemporânea.
Referências
HEALTH–EUROPE, The Lancet Regional. Psychedelic-assisted psychotherapy: hope and dilemma. The Lancet Regional Health-Europe, v. 32, 2023.